É interessante como o novo provoca reações em confronto com os hábitos e costumes instituídos. O conservadorismo se rebela de forma a enfrentar das mais diversas formas uma nova leitura de situações e fatos diante de novos princípios. É o caso da Lei n° 9.099/95 que instituiu novas regras de processo e que pelo princípio da especialidade da norma não pode se render ao Código de Processo Civil, apenas em casos omissos dele se vale subsidiariamente.
O objeto deste artigo é provocar a discussão e o questionamento quanto à contagem do prazo recursal em sede de Juizados Especiais. Assim é importante, antes de adentrar no mérito da questão, apresentar uma rápida e exemplificativa comparação entre o velho e o novo modelo:
· Verifica-se que o prazo para recurso no CPC, art.508 é de 15(quinze) dias, enquanto na Lei Especial, art.42, é de 10(dez) dias;
· No rito ordinário da lei geral o prazo suspende-se com superveniência de férias, CPC-art.179, nos Juizados Especiais, Enunciado FONAJE N° 86, não se suspendem os prazos por motivo de férias;
· Quanto o início da contagem dos prazos versa o art.241 do CPC que é da juntada do mandado, do AR, ou da Carta, ao processo; enquanto nos Juizados Especiais, Enunciado FONAJE N° 13, o início da contagem do prazo é o da data da ciência do ato respectivo;
· Vale observar que o artigo 184 do CPC, que instrui a forma de computar os prazos no processo ordinário, inicia sua redação com a seguinte ressalva : SALVO DISPOSIÇÃO EM CONTRÁRIO. Ora, logo não pode ser considerado princípio jurídico ou mesmo norma cogente !;
· Por outro lado, O PRINCÍPIO DA CELERIDADE está previsto no art.2° da Lei n°9.099/95, e no art.42, interpretado pelo Enunciado n° 13 do FONAJE, indica, peremptoriamente, que a contagem do prazo inicia-se da ciência da sentença. A interpretação literal não pode ser outra, conta-se o dia do começo. (NÃO EXCLUI O DIA DO COMEÇO) Claro que, se o dia do vencimento cair em final de semana ou feriado, prorrogar-se-á ao primeiro dia útil subseqüente;
· Se existe dispositivo de norma que diz salvo disposição em contrário na contagem de prazo se exclui o dia do começo, logo, o correto é não excluir, e sim contar do dia do começo. Se não fosse, não precisaria estar escrito ! E mais, apenas assim se procede, caso não haja disposição em contrário, logo não é regra, mas exceção.
De acordo com o brocardo jurídico lex specialis derrogat generali (A lei especial derroga a geral), a lei de natureza geral, por abranger ou compreender um todo, é aplicada tão-somente quando uma norma de caráter mais específico sobre determinada matéria não se verificar no ordenamento jurídico. Em outras palavras, a lei de índole específica sempre será aplicada em prejuízo daquela que foi editada para reger condutas de ordem geral.
O mérito é exatamente este, a lei de regência dos Juizados Especiais é específica para as ações que abriga, é uma norma especial que deve ser lida em prejuízo dos dispositivos de ordem geral contidas no CPC;
Não há se falar em cerceamento de defesa, se por algum motivo um causídico desprezou tal princípio deixando para praticar o ato no limite do prazo que equivocadamente entendia correto, sendo negado o recebimento do recurso. Pois, não se admite, socorrer-se de elastério interpretativo que afronta o princípio da especialidade, bem como os critérios da economia e o da celeridade processual, basilares dos Juizados Especiais !
Em verdade, ab initio, tal confusão interpretativa foi grafada em diversas literaturas inerentes a matéria sob análise, mas o tempo e a interpretação empírica brasileira têm firmado entendimento que a contagem do prazo, em sede de Juizado Especial, computa-se o dia do começo, sem excluí-lo, diversamente da exceção condita no art.184 do CPC, que por simples hábito, quer-se, revesti-lo de regra, quando é exceção.
Por tudo quanto exposto, defendo que nos Juizados Especiais não se exclui o dia do começo na contagem de prazo.
Eduardo José de Carvalho Soares - Juiz de Direito/PB
Autor: Eduardo José de Carvalho Soares - Juiz de Direito/PB