14/11/2008
DANOS A VEÍCULOS EM ESTACIONAMENTOS

 

DANOS A VEÍCULOS EM ESTACIONAMENTOS


De causar espécie a teimosia decorrente da visão capitalista exacerbada que paira no mundo comercial moderno. Em busca tão só do lucro, ou mesmo da minoração dos custos do empreendimento, comerciantes desprezam as normas jurídicas, eximindo-se deliberadamente de suas obrigações civis, quando não, se fazem de desconhecedores de suas responsabilidades, insistindo em resistir a pretensões jurídicas legítimas com teses notoriamente contrárias à lei.


Exemplo clássico a retratar a nocividade de tal ambição é a resistência dos lojistas à reparação de danos causados em automóveis de clientes que se encontram em estacionamentos de empresas.


A experiência judicante revela que a indisposição ao cumprimento do dever ultra mencionado não é rara, e ocorre tanto preventivamente, (hipótese em que consumidores recebem tickets de estacionamento em cujo verso consta a absurda observação de exclusão total ou parcial de responsabilidades por danos aos automóveis), quanto na esfera defensiva, quando no curso de ações já instauradas por clientes lesados, postam-se as empresas a obstar, com argumentos insólitos, o lídimo direito à indenização do consumidor violado.


Nesse panorama, é imperioso esclarecer à sociedade que o fornecimento de estacionamento não consiste em dever da empresa, contudo, uma vez posto à disposição do cliente passa a constituir serviço prestado ao consumidor. Com efeito, estará o comerciante, lojista ou empresário responsável pela segurança do veículo e objetos nele existentes e, mormente nos casos em que há cobrança de contraprestação em pecúnia, exsurge ínsito ao contrato firmado o dever de guarda e vigilância do automóvel. Eis aí, também, o risco do negócio.


Ademais, ao disciplinar tal relação de consumo, dispõe o Código de Defesa do Consumidor que o fornecedor de serviços responde pela reparação dos danos independentemente da existência de culpa e só não será responsabilizado se conseguir provar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Daí decorre a responsabilidade objetiva das empresas pelos danos que eventualmente sejam causados aos veículos dos clientes, de nada valendo observações que excluam ou minorem suas responsabilidades para com a integridade do patrimônio do consumidor durante o atendimento.


Destarte, provada pelo cliente a relação de consumo (fato de ter ido ao estabelecimento), o dano infligido (furto, arranhão, subtração de pertences no interior do veículo), sua espécie (moral ou material) e sua extensão (valor do prejuízo), forçosa é a reparação dos danos percebidos independentemente da apuração da culpa subjetiva, salvo se a empresa conseguir provar em juízo que o fato decorreu de incúria única e exclusiva do cliente ou de terceiro identificado, ou, ainda, a inexistência material do fato que ensejou o prejuízo, o que representaria a inexistência de defeito no serviço (art.14, parágrafo 3º do CDC).


Nesse diapasão, com o desiderato de se desvencilhar do ônus representado pela presunção da culpa, deveriam os shoppings e congêneres, manter sistemas de monitoramento por câmaras, de modo a viabilizar a comprovação, em juízo, da incolumidade dos veículos que se utilizam dos seus serviços de estacionamento, bem assim se precavendo, por meio de prova documental contundente, contra a investida de eventuais oportunistas ou mal intencionados.


Outrossim, mister se faz frisar que a regra em comento também se aplica aos estacionamentos gratuitos, porquanto, nesses casos, o fornecimento de estacionamento representa um maior atrativo ao consumo pela comodidade que proporciona ao comprador, implementando a atividade lucrativa, de sorte que aquele que dele se utiliza para obter lucro deve assumir o ônus de indenizar os danos nele causados aos clientes.


Embora a matéria em disceptação seja uníssona na jurisprudência pátria, respaldada, inclusive, na Súmula 130 do STJ, ainda nos deparamos com uma forte resistência do empresariado ao cumprimento da norma protecionista do consumidor.


Por conseguinte, imprescindível se faz a ciência, pelo consumidor, dos seus direitos, para a concreta cobrança e utilização, posto que um Estado democrático não se constrói apenas com leis modernas e coerentes, mas, primordialmente, com condutas individuais arrojadas e voltadas à efetivação da cidadania.

 

* Rodrigo Marques Silva Lima - Juiz Titular da 11ª Vara Cível da Capital e juiz auxiliar da presidência do TJ-PB, biênio 2007/2009

Autor:   Rodrigo Marques Silva Lima

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