14/11/2008
O DEVER DE FUNDAMENTAR AS DECISÕES JUDICIAIS E ADMINISTRATIVAS

Até o final do século XVII não havia fundamentação das decisões judiciais, embora haja quem diga1 que as Ordenações Filipinas de 1603 já dispunham a respeito. Outros dizem que a fundamentação tornou-se obrigatória a partir de 1810, na França, quando foi editada uma lei de organização judiciária2.

No Brasil até mesmo antes da independência política já existia o dever de fundamentar as decisões, porém somente a partir de 1850, com o decreto 737, de 25 de novembro daquele ano é que as decisões passaram a ser fundamentadas. As Constituições de 1891 e de 1937 tratavam do assunto, assim como os códigos estaduais de Processo Civil.

Também trataram do assunto os códigos de processo civil de 1939 e o de1973, sendo que em 1988, com a Carta da República, a regra de se motivarem as decisões judiciais ganhou o status de garantia constitucional.

Eis o que diz o art. 93, incisos IX e X da Constituição Federal, com a nova redação data pela emenda 45 de 31 de dezembro de 2005, verbis:

Art. 93 (...):

IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

X – as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros.

Portanto, segundo norma constitucional todos os julgamentos do poder judiciário devem ser motivados, sob pena de nulidade. Também devem ser motivados os pareceres dos representantes do Ministério Público, em obediência à regra estabelecida na Constituição Federal. Ademais, se extrai desta que todas as decisões administrativas dos órgãos judiciários devem se fundamentas.

“Trata-se de uma imposição do princípio do devido processo legal em que se busca a exteriorização das razões de decidir, o revelar do prisma pelo qual o poder judiciário interpretou a lei e os fatos da causa. Por isso, é importante que as razões venham expostas com clareza, lógica e precisão, visando à perfeita compreensão de todos os pontos controvertidos, bem como do desfecho da demanda.”3

A motivação é obrigatória em todos os pronunciamentos judiciais, inclusive nos despachos, e até nas decisões administrativas.

A fundamentação concisa não se confunde com falta de fundamentação, sendo, portanto, admitida.

 É importante motivar a decisão, pois viabiliza a vinculação do juiz à prova, o conhecimento das razões com vistas a um recurso adequado. Mostra, ainda, a motivação, que o resultado da lide não foi sorte, não é fruto do acaso, permitindo que os tribunais superiores reconheçam erros nas sentenças.

A fundamentação deve ser vista nos aspectos endoprocessuais e extraprocessuais.

Mas o que é fundamentar?

Fundamentar é dar o juiz as razões de fato e de direito que o convenceram a decidir a questão daquela maneira.

Não deve o juiz fundamentar somente na lei, devendo levar em consideração outros aspectos como o fato, o valor e a norma. Portanto, o magistrado deve ter uma visão tridimensional do direito. Não basta uma fundamentação apenas baseada na legislação, devendo o juiz levar em conta o fato, a norma e a valoração. Deve-se especificar fatos alegados pelas partes e provas, dar fundamentos por que aceitou tal prova, porque rejeitou aquela e dizer como se chegou à conclusão. Deve, portanto, haver fundamentação valorativa. O juízo de valor deve ser levado em conta, pois o direito não se encerra na norma.

 Não basta, pois, como acontece rotineiramente, dizer: “ausentes os pressupostos, denego a medida”, nem dizer que segundo a prova documental e testemunhal a lide deve ser julgada procedente. O Juiz deve analisar as provas e dizer por que acatou aquelas. Não pode, também, decidir a lide com base nas razões de uma das partes, sem dizer por que as aceitou. Pode fundamentar a decisão no parecer do representante do Ministério público, embora tenha que dizer por que aceita as razões daquele.

É com a fundamentação que podemos saber se o magistrado submeteu-se aos postulados pré-estabelecidos, pois o destinatário da fundamentação é a opinião pública, é o povo, havendo conexão com o princípio da publicidade. Há, portanto, controle das decisões pela população.

A falta de fundamentação, segundo o preceito constitucional acarreta nulidade da decisão, sendo que alguns entendem que a decisão sem motivação é inexistente. Não concordamos com a opinião daqueles que dizem que a decisão é inexistente, pois ela existe e produz efeitos, se emanada de órgão competente, até que seja declarada nula.

 Também não concordamos com a proposição de que ela é nula, pois embora juristas de renome com Nelson Nery e outros digam que as decisões sem fundamentação sejam nulas, elas, na verdade, são anuláveis, podendo produzir efeitos, devendo prevalecer aqui o princípio da segurança jurídica, pois decorrido o prazo para ação rescisória não podem ser desfeitas. É o que sempre aconteceu nas decisões administrativas do Tribunal de Justiça da Paraíba quando aprecia promoções e remoções de magistrados por merecimento, todas sem fundamentação, sendo, portanto, anuláveis, e não nulas, podendo o interessado recorrer dessas decisões. O mesmo ocorre naquelas decisões liminares em que o juiz diz “presentes os requisitos concedo a liminar”, podendo elas ser válidas se a parte interessada dela não recorrer.

  Bibliografia

NOJIRI, Sérgio. O dever de Fundamentar as Decisões Judiciais. 2ª. Ed.rev.atual. e ampl..São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 2000.

POTANOVA,  Rui. Princípios do Processo Civil . 2 ª tir. Livraria do Advogado: Porto Alegre, 1997.

JÚNIOR, Nelson Nery. Princípios do Processo Civil Na Constituição. 8ª. ed. rev. e ampl..São Paulo:Revista dos Tribunais, 2004.

CALAMANDREI, Piero. Eles, Os Juízes, Vistos Por Um Advogads. São Paulo: Martins  Fontes.1995.

 

1 Nojiri, Sérgio. O dever de Fundamentar as Decisões Judiciais. 2ª. Ed.rev.atual. e ampl..São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 2000. p. 28.

2 Potanova, Rui. Princípios do Processo Civil . 2 ª tir. Livraria do Advogado: Porto Alegre, 1997.p. 248

3 Cruz e Tucci, citado por Rui Potanova às p. 248. op. Cit.

Autor:   Antonio Rudimacy Firmino de Sousa - Juiz da 2ª Vara da Fazenda de Campina Grande-PB

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