24/11/2008
O direito à convivência familiar

A implantação do Cadastro Nacional de Adoção pelo Conselho Nacional de Justiça jogou luz sobre uma questão pouco conhecida no país. Nele foram inseridos os dados dos pretendentes à adoção e suas preferências em relação às características das crianças que pretendem adotar, o mesmo ocorrendo com as crianças e adolescentes em condições de serem adotados no país.


Com isso, o Brasil dá um significativo passo para eliminar a burocracia do processo que envolve a adoção. Agora, com uma única habilitação, o pretendente poderá ser consultado para adotar em todo o país, tornando desnecessária a reprodução do processo e sua distribuição para outras cidades a fim de aumentar as possibilidades de ter o nome consultado.


Em relação às crianças e adolescentes em condições de adoção, aumentam-se as possibilidades de encontro de famílias substitutas, pois, se antes a pesquisa era realizada apenas entre os pretendentes habilitados na mesma comarca de sua residência, agora a consulta poderá ser ampliada para cerca de 3 mil varas da infância e juventude do país.


Tal medida potencializa as possibilidades de adoção, de modo que, se em uma cidade nenhum dos pretendentes aceita uma criança com determinadas características, pode ser que em outra haja um pretendente que a aceite. Antes, a aproximação seria quase que impossível.


Outro avanço significativo ocorre nos novos parâmetros para a definição de políticas públicas de promoção do direito à convivência familiar no país. Até hoje, havia grandes dificuldades para o estabelecimento de planos para o enfrentamento da difícil questão relacionada às crianças que vivem fora de famílias.


A principal causa era a ausência de um órgão centralizador das informações, faltava conhecimento global de quem é o pretendente à adoção, qual a sua renda, qual a sua formação e, principalmente, qual a sua preferência em relação às características da criança pretendida. Informações necessárias para a adequada compreensão dos motivos que levam o país a ter, de um lado, pouco mais de 11 mil pretendentes e, de outro, cerca de 2 mil crianças e adolescentes aguardando uma família.


Também não era conhecida a realidade das crianças e adolescentes em condições de adoção. Por que razão se encontram nessa situação? Quantas são? Qual a cor da sua pele? Qual a idade média? De todas essas dúvidas, persistiu até hoje a maior delas: por que razão há esse desencontro entre os pretendentes e as crianças e adolescentes em condições de adoção?


Com a inserção dos dados no cadastro, é possível ter algumas respostas. Dos 11.125 pretendentes à adoção, 90% são casados ou vivem em união estável, 10% vivem sozinhos e, nessa condição, pretendem assumir a paternidade ou a maternidade. A maioria (50%) possui renda média entre três e 10 salários mínimos, e não tem filhos (76,5%).


Quanto às preferências, 70% só aceitam crianças brancas. A grande maioria dos que querem adotar é também branca (70%). Já 80,7% exigem crianças com o máximo de três anos; o sistema mostra que apenas 7% das disponíveis para adoção possuem essa idade. Além disso, 86% só aceitam adotar crianças ou adolescentes sozinhos, quando é grande o número dos que possuem irmãos, e separá-los constituiria um novo rompimento, o que deve ser evitado a todo custo. Todos esses pontos se apresentam como um grande fator de restrição.


Os dados mostram que não se pode atribuir exclusivamente à morosidade do Poder Judiciário o motivo pelo qual não ocorrem mais adoções no país. A resposta a essa questão não é tão simples e comporta vários enfoques.


É inegável o fato de que o juiz brasileiro, e em especial aquele que atua na área da infância e juventude, não fica apenas aguardando medidas legislativas para melhor desenvolver sua atuação. Ao contrário, procura desenvolver mecanismos e sistemas que possam otimizar sua função e com isso minimizar o sofrimento de milhares de brasileiros que têm diariamente violados seus direitos.


Cada vez mais o juiz, para além de mero mediador de conflitos, se apresenta como um instrumento para a garantia de direitos fundamentais, legitimado que está pela Constituição Federal e a estrutura democrática que dela decorre. E, no exercício dessa função, desenvolve ferramentas para otimizar sua atuação. O Cadastro Nacional de Adoção é uma delas, cujo objetivo é assegurar o direito à convivência familiar, por ser esta o primeiro espaço para a proteção de todos os direitos fundamentais.


Publicado no Correio Braziliense (DF), em 22.11.2008

 

Autor:   ANDRÉA PACHÁ e FRANCISCO DE OLIVEIRA NETO

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