28/08/2017
Vencedor do Prêmio Innovare 2016 fala sobre alternativas que podem contribuir para desafogar o sistema prisional brasileiro


Eduardo Lino Bueno Fagundes Júnior, titular da 1ª Vara de Execução Penal do TJPR, é engajado em projetos que contribuem para desafogar o sistema prisional e melhorar as condições de encarceramento no estado do Paraná. Ganhou notoriedade nacional ao ganhar o Innovare, com projeto que faz com que pessoas que já completaram o tempo para ter seus direitos reconhecidos saiam imediatamente. Na magistratura há 20 anos, atua desde 2011 exclusivamente em VEPs. Para ele, o sistema beira o colapso, mas existem soluções possíveis, desde que partam de ações integradas entre os órgãos envolvidos e, ainda, entre os próprios poderes da União.
 
Como o senhor avalia a situação do sistema carcerário do País?
 
É uma situação que só piora e um dos maiores problemas é que nunca houve relação entre o número de prisões e a quantidade de vagas que os estados disponibilizam. Se colocarmos 700 pessoas onde cabem 200 vai acontecer uma tragédia atrás da outra. O Estado não consegue conter essas pessoas, dar condições de ressocialização. Pela ausência de informações mais precisas, até o Executivo fica em situação difícil, porque é preciso saber onde construir novos estabelecimentos e para quantas vagas. Não se pode colocar uma pessoa por cima da outra.
 
Nesse contexto, como o senhor vê o papel do juiz?
 
O juiz tem um conjunto de leis a cumprir, que são a penal, de execução penal, processual…, mas, acima de tudo, há o conjunto de princípios constitucionais que tratam da dignidade da pessoa humana, com a vedação ao tratamento degradante e a tortura. O juiz não pode admitir violação aos direitos humanos, mas ficamos diante de um paradoxo. Claro que não podemos soltar pessoas que têm de cumprir as penas, mas, de outro lado, não podemos deixar acontecer situações degradantes.
 
A comunicação e a sintonia entre os Poderes é importante?
 
Totalmente. No Paraná, temos um projeto que está aos cuidados do Grupo de Monitoramento do Sistema Carcerário, vinculado à Presidência do Tribunal de Justiça. Dividiram-se as vagas entre presos provisórios e definitivos. Quando o limite de ocupação se aproxima, o juiz pode, por exemplo, aplicar uma medida alternativa para o preso provisório e liberar a vaga.
 
Como é feito esse acompanhamento?
 
Estamos conversando com todos os juízes. Há casos em que o preso não pode ser solto ou cumprir medida alternativa, de jeito nenhum. Não pressionamos ninguém a ter menos presos. Queremos que cada juiz diga o que vivencia e o que pleiteia e, posteriormente, vamos tabular tudo isso. Desta forma, nos organizamos para termos em mão os dados concretos e confiáveis para demandarmos o Poder Executivo na construção de casas de custódia, penitenciárias, conforme a necessidade real de cada vara, em todos os níveis.
 
Em que medida a construção de presídios contribui para resolver a superlotação?
 
Percebe-se que ações isoladas não resolvem. A construção de presídios, por si só, não tem se mostrado uma boa solução para o problema da superlotação, mas é importante. Existem várias alternativas além do encarceramento. As decisões do próprio STF, por exemplo, colocam várias hipóteses quando não há vagas suficientes, como o monitoramento eletrônico, a prisão domiciliar, a antecipação de direitos, entre outros, para que a situação se equacione. No Paraná, por exemplo, passamos de um presídio, há 25 anos, para 33 e hoje estão todos superlotados.
 
Depois do trabalho que rendeu o Innovare, o senhor já acompanha outro projeto piloto, realizado pelo TJPR. Como é desenvolvida essa iniciativa?
 
É um projeto de presídio modelo desenvolvido desde novembro de 2016 na Penitenciária Central do Estado – Unidade de Progressão de Regime, que fica em Piraquara, na Grande Curitiba. O local recebeu benfeitorias e abriga 188 presos e para cada um que entra outro sai. Não fica ninguém além do limite. Cada preso tem vaga de trabalho e estudo, assistência social e jurídica, e Justiça Restaurativa.
 
Que critérios foram adotados para estabelecer quais presos iriam para lá?
 
Em razão da própria superlotação, o estado não consegue fazer a classificação do preso quando ele entra para o sistema. Obedecemos rigorosamente a lei de execução penal e entrevistamos os que estavam a três anos, ou menos, de progredir para o regime semiaberto. A maioria cometeu crimes graves. Como parte do projeto, quem sai é acompanhado por um escritório social, que é um aparelho do estado que funciona em rede com todas as secretarias de governo. Mais de dez presos já saíram e até o momento nenhum reincidiu.
 
Limitador de vagas e ressocialização seriam, então, as principais ações para melhorar o sistema prisional?
 
Eu creio que todos os projetos que têm sido apresentados Brasil afora são bons, mas realmente sem esse limitador do qual falamos, nenhum deles consegue funcionar de forma adequada e consistente. Aliado a isso, precisamos, sim, dar assistência ao preso depois que ele sai. Se observarmos os dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), de cada dez pessoas que vão para os presídios, oito voltam a praticar crimes. O sistema carcerário está muito inchado. Isso faz com que funcione de forma contrária a que foi concebida, ou seja, para que o preso tenha condições de refletir sobre o seu erro, de melhorar, sair de lá e não incorrer em mais nada. A situação hoje é muito pesada. O Poder Executivo e os departamentos penitenciários gastam energia demais nesse caos que virou o regime fechado e acabam abandonando o acompanhamento posterior, que é fundamental.
 
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Assessora de Imprensa - Jaqueline Medeiros

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Jornalista Responsável: Jaqueline Medeiros - DRT-PB 1253